Os pagamentos serão realizados via BitGo e Kraken, em dólar ou stablecoins.
O processo de liquidação da FTX, uma das maiores exchanges de criptomoedas a colapsar, alcançou um marco que poucos acreditavam ser possível há três anos.
O FTX Recovery Trust, a massa falida, anunciou a distribuição de aproximadamente US$ 1,6 bilhão a credores com reivindicações inferiores a US$ 50 mil.
Trata-se da terceira rodada de pagamentos desde a criação do fundo de recuperação, e com ela o montante total devolvido aos investidores ultrapassa US$ 8 bilhões.
Como a FTX vai pagar seus credores
Segundo o comunicado oficial, os pagamentos serão realizados por meio das plataformas BitGo e Kraken, duas empresas que figuram entre as mais sólidas do setor.
A estrutura permite que os beneficiários escolham entre receber em dólares norte-americanos ou em stablecoins como USDC e USDT. Sempre após a verificação de identidade (KYC).
A lógica da nova rodada é beneficiar de maneira mais ampla os pequenos investidores, que foram os mais impactados pelo colapso da exchange em novembro de 2022 e perderam suas melhores criptomoedas no processo. Milhares de usuários que tinham saldos modestos ficaram à mercê de longos processos judiciais.
Agora, com o pagamento para quem possui reivindicações inferiores a US$ 50 mil, o fundo busca uma maior justiça distributiva. O foco é devolver liquidez a uma camada significativa da base de clientes.
De acordo com o relatório publicado pelo FTX Recovery Trust, as taxas de recuperação variam entre 122% e 138%, dependendo da categoria do credor.
Isso significa que, em algumas situações, os beneficiários podem receber valores superiores aos que haviam perdido originalmente, devido à incorporação de juros e à valorização de ativos recuperados durante a liquidação.
Essa situação inusitada de ‘recuperação acima de 100%’ tem sido observada como um fenômeno raro no mundo das falências corporativas.
Origem dos recursos
Os recursos têm diversas origens. Por exemplo, parte foi obtida por meio da recuperação de ativos desviados pelos antigos executivos. Mas outra parcela veio da venda de participações em empresas adquiridas pela FTX no auge do mercado, entre 2020 e 2022. Além disso, processos judiciais contra terceiros e acordos de restituição contribuíram para reforçar o caixa do fundo de recuperação.
Entre as classes de credores, alguns grupos já haviam recebido ressarcimentos completos, como os credores administrativos e de prioridade. Os credores quirografários, que não possuem garantias específicas, ainda enfrentam um processo mais complexo. Mas já começam a ser atendidos com a nova rodada.
O relatório detalha ainda casos como os chamados ‘Dotcom Customer Claims’ e ‘Secured Claims’, que têm estruturas diferenciadas de prioridade no recebimento.
O mercado enxerga o uso da BitGo como custodiante como um pilar de segurança. A empresa, que já atua com diversos ETFs de Bitcoin aprovados pela Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC), fornece infraestrutura regulada para a guarda de ativos digitais.
A Kraken, uma das exchanges mais antigas em operação, escolheu executar os pagamentos globais em criptomoedas aproveitando sua alta liquidez. Essa estratégia permite que o ressarcimento ocorra de forma híbrida, combinando ativos digitais e moeda fiduciária.
FTX é ‘laboratório vivo’
Especialistas destacam que o caso FTX se tornou um ‘laboratório vivo’ para o sistema financeiro global. É a primeira vez que bilhões de dólares em ativos digitais precisam ser liquidados em um processo falimentar supervisionado em múltiplas jurisdições.
O sucesso das rodadas iniciais mostra que o setor amadureceu em termos de governança, compliance e mecanismos de execução.
No entanto, a recuperação não elimina as cicatrizes deixadas pelo colapso. Muitos investidores institucionais, que chegaram a aportar centenas de milhões de dólares na FTX, ainda discutem judicialmente a extensão dos ressarcimentos.
Além disso, existe um debate sobre a responsabilidade de auditores e consultores que trabalharam com a exchange e não identificaram as inconsistências em seus balanços. Outro impacto relevante é sobre a confiança dos usuários no setor.
Episódio ainda assombra o mercado
Embora a devolução de recursos em larga escala traga alívio, a quebra da FTX ainda marca a memória de muitos como um dos episódios mais traumáticos da história das criptomoedas, comparável ao colapso da Mt. Gox em 2014.
A diferença é que, no presente caso, a recuperação financeira está sendo significativamente superior, tanto em valores quanto em proporção.
O retorno de mais de US$ 8 bilhões aos credores também deve ter efeitos sobre o mercado.
Parte dos beneficiários pode reinvestir os valores em criptomoedas, impulsionando a demanda por ativos como Bitcoin e Ethereum. Outros podem optar por migrar para investimentos mais conservadores, após experimentarem na prática os riscos de plataformas centralizadas.
Os analistas acompanharão de perto esse fluxo de capital, pois ele pode influenciar diretamente a liquidez e a volatilidade dos mercados nos próximos meses.
Reguladores observam FTX de perto
Reguladores ao redor do mundo também observam o caso com atenção. Nos Estados Unidos, a SEC e a CFTC utilizam o exemplo da FTX para argumentar sobre a necessidade de regras mais rígidas para exchanges e custodiantes. Na Europa e na Ásia, debates semelhantes estão em curso, e a execução do FTX Recovery Trust pode ser referência para novos marcos regulatórios.
Além disso, há a dimensão política. O colapso da FTX teve repercussões em campanhas eleitorais, especialmente devido às conexões do ex-CEO Sam Bankman-Fried com políticos norte-americanos.
O fato de os credores estarem recebendo pagamentos substanciais ameniza, em parte, a pressão pública sobre autoridades que falharam em fiscalizar a empresa no passado.
Efeito piscológico
Por fim, outro ponto de destaque é o efeito pedagógico no ecossistema cripto. O caso mostrou a importância de auditorias independentes, segregação de fundos e uso de custodiante de terceiros. Muitas exchanges passaram a reforçar suas práticas de governança após a queda da FTX, justamente para evitar comparações e recuperar a confiança do mercado.
Com mais de US$ 8 bilhões já devolvidos, o caso FTX entra para a história não apenas pelo tamanho da falência, mas também pela magnitude da recuperação obtida.
Pouco menos de três anos após o colapso, milhares de investidores de varejo e institucionais já receberam o dinheiro de forma parcial ou completa. Ainda há desafios no horizonte, mas cada rodada de pagamento fortalece a narrativa de que o setor cripto está amadurecendo e desenvolvendo mecanismos internos de resiliência.
Disclaimer: Coinspeaker está comprometido em fornecer reportagens imparciais e transparentes. Este artigo tem como objetivo fornecer informações precisas e oportunas. Mas não deve ser considerado como conselho financeiro ou de investimento. Como as condições do mercado podem mudar rapidamente, recomendamos que você verifique as informações por conta própria. E consulte um profissional antes de tomar qualquer decisão com base neste conteúdo.
next