SEC inicia turnê nacional para ouvir startups cripto com até dois anos e menos de 10 funcionários, em 10 cidades até dezembro.
Comandada por Hester Peirce, a iniciativa busca democratizar o diálogo regulatório e reduzir a centralização em Washington.
Projetos interessados devem enviar proposta por e-mail com nome, cidade e descrição da equipe até as datas dos eventos.
A ação marca uma mudança de postura da SEC e pode influenciar globalmente a forma como reguladores se aproximam da Web3.
A Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) anunciou nesta quinta-feira (1º) uma nova etapa de seu esforço de aproximação com o setor de ativos digitais. Liderada pela comissária Hester Peirce, a Crypto Task Force da agência organizará uma série de mesas-redondas presenciais em cidades em diferentes regiões dos Estados Unidos nos próximos meses.
Batizada de ‘Crypto Task Force On The Road’, a iniciativa busca atrair especialmente representantes de projetos cripto com até dois anos de existência e menos de dez funcionários. Desse modo, amplia o escopo de participação em debates regulatórios que até agora estavam concentrados em Washington D.C.
No Brasil, esse movimento ocorre há anos por meio de entidades como ABCripto e ABToken, que detêm um canal de comunicação bastante aberto com reguladores como o Banco Central (BC) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Encontros da SEC ocorrerão em diversas cidades dos EUA
Os encontros começam em 4 de agosto em Berkeley, na Califórnia, e seguem até dezembro. Além disso, o encontro terá paradas em cidades como Boston, Dallas, Chicago, Nova York, Irvine, Cleveland, Scottsdale e Ann Arbor.
Para participar, é preciso enviar um e-mail para [email protected] com o assunto ‘Crypto on the Road’. Ademais, os interessados devem indicar os nomes de até dois representantes, a cidade em que desejam participar e uma breve descrição da equipe e do projeto.
A SEC promete divulgar publicamente a lista de projetos participantes, como forma de promover a transparência no processo.
De acordo com Peirce, a intenção é alcançar empreendedores e desenvolvedores que não conseguiram participar dos encontros anteriores na capital federal:
Queremos ouvir pessoas que ainda não tiveram voz no processo de formulação de políticas. A Crypto Task Force está ciente de que qualquer estrutura regulatória terá efeitos amplos, por isso buscamos tornar nosso alcance o mais inclusivo possível.
A novidade ocorre em um momento de crescente interesse em ICOs de criptomoedas e novos projetos de blockchain.
A comissária é conhecida por defender uma abordagem mais aberta à inovação. Por isso, ganhou o apelido de ‘crypto mom’ pela comunidade. Ela tem sido uma voz dissidente dentro da própria SEC nos últimos anos, especialmente em contraponto à postura do ex-presidente Gary Gensler.
Peirce e a Task Force
Desde o início de 2025, Peirce lidera a Crypto Task Force, que ganhou força sob a presidência interina de Mark Uyeda. No geral, a administração de Donald Trump se mostra bastante pró-cripto desde que tomou posse no início do ano.
Agora, a iniciativa ganha um novo capítulo. O novo chairman da SEC, Paul Atkins, assumiu com a missão de reestruturar a agenda regulatória para ativos digitais nos Estados Unidos.
A Crypto Task Force foi oficialmente criada em janeiro deste ano e já realizou uma série de mesas-redondas em Washington, com foco em temas como tokenização de valores mobiliários, definição jurídica de criptoativos, transparência, staking, stablecoins e infraestrutura de mercado.
Agora, com a nova fase, a agência busca descentralizar o processo de consulta. Os encontros são um dos meios que a agência adotou para ouvir diretamente empresas que estão fora dos grandes centros regulatórios e que representam a base do ecossistema.
O movimento é visto como um aceno à indústria cripto, que há anos critica a falta de clareza jurídica e a abordagem baseada exclusivamente em enforcement.
A estratégia itinerante também é uma resposta à pressão do Congresso norte-americano, que exige maior previsibilidade e engajamento com o setor em meio à tramitação de projetos de lei que tratam de stablecoins, custódia digital e jurisdição de agências federais sobre criptoativos.
A escolha de pequenos projetos como alvo prioritário da consulta não é aleatória. Afinal, a SEC reconhece que a maioria das inovações em blockchain parte de times enxutos, muitas vezes com pouca estrutura jurídica ou acesso a lobby institucional.
Canal direto com a agência
Ao abrir espaço para que esses atores falem diretamente com a agência, a comissária busca criar um canal direto entre desenvolvedores e formuladores de políticas. Além disso, o foco em empresas com menos de dois anos evita que apenas grandes exchanges, gestoras ou fundos dominem o debate.
O processo também pode gerar visibilidade para essas startups, já que a lista de participantes será publicada no site da SEC. Portanto, dá reconhecimento e pode gerar interesse de investidores ou parceiros.
Apesar do tom inclusivo, a iniciativa tem limitações. A SEC já informou que nem todos os projetos serão atendidos nas sessões presenciais. A seleção será feita com base na relevância, diversidade geográfica e representatividade das propostas.
Projetos que não forem escolhidos ainda poderão enviar contribuições por escrito, que serão analisadas pela equipe da Task Force.
A proposta também enfrenta desafios internos. Por exemplo, alguns membros da própria comissão, como Caroline Crenshaw, já manifestaram preocupação com a adoção de tecnologias ainda não maduras em ambientes de varejo. Também pedem mais cautela e foco na proteção ao investidor.
Ainda assim, a liderança de Peirce tem garantido espaço para um diálogo mais técnico e menos político. Aliás, uma prova disso é a continuidade do projeto mesmo após mudanças no comando da agência.
União entre cripto e SEC
Para analistas do setor, o comunicado oficial sobre a iniciativa representa um marco importante na evolução da relação entre governo e indústria cripto nos Estados Unidos. Ainda existem incertezas sobre como será a regulação definitiva. Mas o fato de a SEC sair de sua sede para ouvir diretamente projetos pequenos sinaliza uma inflexão na postura histórica da instituição.
Além disso, mostra que os Estados Unidos tentam recuperar o protagonismo global no debate sobre blockchain. Isso ocorre após anos de inércia regulatória, com a perda de empresas para jurisdições como Suíça, Emirados Árabes e Cingapura.
A expectativa é que os encontros resultem em relatórios e propostas de regras mais conectadas com a realidade do mercado. Isso pode beneficiar tanto investidores quanto desenvolvedores.
A tokenização de ativos, as finanças descentralizadas e os contratos inteligentes vêm desafiando fronteiras e mercados tradicionais. Portanto, a capacidade de ouvir o mercado em sua diversidade se torna um ativo regulatório por si só. Por exemplo, no Brasil o mercado avançou exponencialmente no setor de tokenização justamente pelo fato de o regulador ouvir o que os agentes participantes têm a dizer.
Por fim, vale recordar que Peirce já declarou em diversas ocasiões que pretende transformar a ‘corrida pela clareza’ iniciada em Washington em uma maratona de escuta e adaptação contínua. Agora, ela leva essa promessa para a estrada.
Disclaimer: Coinspeaker está comprometido em fornecer reportagens imparciais e transparentes. Este artigo tem como objetivo fornecer informações precisas e oportunas. Mas não deve ser considerado como conselho financeiro ou de investimento. Como as condições do mercado podem mudar rapidamente, recomendamos que você verifique as informações por conta própria. E consulte um profissional antes de tomar qualquer decisão com base neste conteúdo.
Marta Barbosa Stephens é escritora e jornalista formada pela Universidade Católica de Pernambuco, com mestrado na PUC São Paulo e pós-graduação em edição na Universidade de Barcelona.
Trabalhou em diversas redações de jornais e revistas no Brasil. Foi repórter de economia no Jornal da Tarde, do grupo O Estado de São Paulo e editora-adjunta de finanças pessoais na revista IstoÉ Dinheiro. Atuou no mercado de edição de livros de finanças em São Paulo e foi, por seis anos, redatora-chefe da revista Prazeres da Mesa (https://www.prazeresdamesa.com.br/), antes de se mudar para Inglaterra.
No Reino Unido, foi editora do jornal Notícias em Português, voltado à comunidade lusófona na Inglaterra.
Escreve e edita sobre o mercado de criptomoedas e tecnologia blockchain desde 2022.
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