Banco Central inclui stablecoins em câmbio

Decisão reforça o que Rafael Castaneda, VP da Oxus Finance, havia dito em entrevista à Coinspeaker na Satsconference 2025.

Leonardo Cavalcanti By Leonardo Cavalcanti Atualizado em 7 mins read
Banco Central inclui stablecoins em câmbio

Resumo da notícia

  • Banco Central passa a reconhecer pagamentos internacionais com cripto como operações de câmbio.
  • A decisão busca formalizar o uso crescente de stablecoins em remessas e liquidações internacionais.
  • Rafael Castaneda (Oxus Finance) afirma que isso confirma o 'efeito cavalo de Troia' da integração cripto-financeira.
  • Para ele, o fim do Drex foi apenas o abandono de uma tecnologia, não da ideia de digitalizar o real.

O Banco Central do Brasil (BCB) decidiu nesta segunda-feira (10/11) que pagamentos e transferências internacionais com ativos virtuais, ou stablecoins, passam oficialmente a fazer parte do mercado de câmbio, segundo novas normas publicadas pela autoridade monetária.

Assim, o movimento coloca o Brasil na vanguarda regulatória da América Latina e aproxima, de forma prática, o universo cripto do sistema financeiro tradicional.

Stablecoins no mercado de câmbio

A decisão foi formalizada por meio de ajustes normativos no arcabouço cambial, que passam a reconhecer operações com ativos virtuais.

Ou seja, incluindo stablecoins e tokens de liquidação digital, como instrumentos legítimos para transferências internacionais.

Isso significa que empresas licenciadas para operar câmbio poderão processar transações com criptoativos. Isso, desde que cumpram as obrigações de registro, rastreabilidade e reporte já previstas para operações convencionais.

A medida integra a agenda de prioridades regulatórias 2025-2026 do Banco Central. Ela representa uma resposta ao crescimento exponencial do uso de stablecoins de dólar em remessas e pagamentos internacionais.

Relatórios recentes do BCB e de consultorias independentes indicam que essas moedas digitais privadas já movimentam bilhões de reais em transações informais de câmbio.

Isso, especialmente entre empresas de tecnologia, importadores e profissionais que recebem em dólar por prestação de serviços.

O novo enquadramento legal, portanto, busca trazer essas operações para dentro do sistema regulado, oferecendo mais segurança jurídica, supervisão e transparência.

A visão de Castaneda: ‘O efeito cavalo de Troia’

O anúncio do Banco Central vai ao encontro do que Rafael Castaneda, VP e COO da Oxus Finance, havia antecipado dias antes, durante entrevista concedida à Coinspeaker na Satsconference 2025.

Para o executivo, o processo de integração entre o mercado financeiro e o mercado das melhores criptomoedas é inevitável e já estava em curso mesmo antes da formalização do BC.

‘O que caiu no Drex não foi a ideia de digitalizar o real, mas o modelo tecnológico escolhido. O Banco Central quer eficiência eletrônica e controle do dinheiro, e isso continua. A regulação está avançando justamente para permitir que o sistema financeiro usufrua dos benefícios do blockchain dentro de um ambiente controlado’, afirmou.

Segundo ele, o reconhecimento oficial das transações internacionais com criptoativos como operações de câmbio representa um marco daquilo que chama de ‘efeito cavalo de Troia’: o momento em que a economia digital começa a se infiltrar nas estruturas do sistema tradicional e, ao fazer isso, conquista legitimidade e espaço institucional.

‘Se há regulação para esses atores se enquadrarem, há um efeito cavalo de Troia. As empresas vão gastar dinheiro, vão precisar se adequar, mas ao fazer isso ganham espaço de legitimidade. A economia de blockchain começa a se embrenhar no sistema financeiro tradicional. Isso, bem ou mal, é uma vitória’, disse Castaneda.

Do Drex às stablecoins: o Banco Central muda de rota

A decisão do BC vem poucos meses depois da confirmação de que o projeto Drex, moeda digital de banco central (CBDC) do Brasil, foi descontinuado em sua forma original.

O Drex havia sido anunciado como uma tentativa de modernizar o sistema de pagamentos e criar infraestrutura para tokenização de ativos, mas enfrentou desafios técnicos e resistência de parte do setor financeiro.

Castaneda, na entrevista, afirmou que o fim do Drex não significava o fim da digitalização do real. Mas o reconhecimento de que a dinâmica de mercado já havia avançado por conta própria, liderada pelas stablecoins privadas.

‘Nos Estados Unidos, a competição é entre as stablecoins de dólar e a CBDC do Fed. No Brasil, era entre o Drex, que seria a CBDC do real, e as stablecoins de dólar. Hoje, o que tem relevância no mercado global são as stablecoins de dólar, não as de real’, avaliou.

A nova norma do BC, ao aceitar oficialmente as operações internacionais com cripto dentro do regime cambial, confirma essa mudança de eixo: a política monetária e cambial brasileira passa a conviver com moedas privadas digitais emitidas fora do país e, em muitos casos, lastreadas em dólar.

Um movimento de pragmatismo regulatório

A medida da instituição reflete pragmatismo regulatório. Em vez de tentar conter o avanço das stablecoins, o Banco Central opta por incorporá-las ao seu escopo de supervisão. Isso também coincide com o que Castaneda chamou de ‘realismo monetário’ durante sua fala na Satsconference.

‘As stablecoins de dólar se tornaram um meio de propagar o dólar no mundo e são mais eficientes do que uma CBDC norte-americana. O Federal Reserve teria que obedecer regras internacionais, mas Tether e Circle empurram dólares pela internet em qualquer país, e ninguém consegue impedir’, explicou.

Para o executivo, o fenômeno representa uma nova fase da dolarização global. Agora digital e descentralizada. E, ao permitir que essas operações entrem no sistema regulado, o Brasil tenta equilibrar soberania monetária e competitividade econômica.

O desafio do real digital e o papel do Pix

Questionado na entrevista sobre as stablecoins de real, Castaneda se mostrou cético quanto à sua relevância, especialmente diante da eficiência do Pix.

‘É muito difícil uma stablecoin local competir com o Pix. O Pix já é extremamente eficiente. Enquanto ele rodar bem e o governo não exercer um controle tirânico sobre ele, o sistema tradicional continuará dominante’, afirmou.

O executivo acredita que o Pix continuará sendo a principal ferramenta de inclusão e eficiência doméstica, enquanto as stablecoins e as operações internacionais com cripto passam a ocupar o espaço das transações transfronteiriças e de reserva de valor.

A leitura é reforçada pelo novo regulamento do Banco Central: a autarquia não propôs substituir o sistema cambial tradicional nem criar uma moeda digital própria, mas reconhecer juridicamente o uso de ativos virtuais como meios de liquidação e pagamento em operações externas.

Da margem ao mainstream

A decisão do BC também representa uma vitória simbólica para empresas que, como a Oxus Finance, operam infraestrutura de pagamentos e liquidação digital baseada em blockchain. Ao enquadrar o uso de cripto no câmbio, o regulador permite que essas companhias participem do sistema financeiro de forma mais transparente e segura.

Castaneda vê o momento como o início de uma nova fase de cooperação entre inovação e regulação. ‘O grande dinheiro é o dinheiro regulado, e ele vai querer usufruir dos benefícios de uma nova tecnologia. Isso não vai acontecer na base da anarquia. Vai haver concessões, ajustes e, espero, um resultado que traga maior autonomia econômica e financeira para a sociedade.’

Além disso, na avaliação de Castaneda, o que está em jogo é uma recomposição de forças entre o sistema financeiro tradicional e o ecossistema cripto.

‘Em uma guerra tecnológica e socioeconômica, o resultado final é sempre um meio do caminho. Nem será a obliteração da blockchain pelo sistema tradicional, nem o anarcocapitalismo cypherpunk que destrói bancos e governos. Os dois mundos vão se adaptar’, afirmou.

A nova regulamentação do Banco Central parece confirmar essa leitura. Ao reconhecer o papel dos ativos virtuais nas transações internacionais, o órgão não abdica do controle cambial, mas o compartilha e, ao fazê-lo, pavimenta o caminho para uma integração estrutural entre finanças tradicionais e digitais.

Impactos imediatos

Para empresas que operam câmbio, pagamentos internacionais, tokenização de ativos ou custódia cripto, a norma representa um divisor de águas.

Elas passam a poder oferecer serviços com ativos virtuais dentro do mesmo regime jurídico das operações cambiais tradicionais, desde que respeitem as exigências de registro, compliance e PLD/FT (prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo).

O passo seguinte, segundo fontes do setor, será a edição de instruções complementares detalhando requisitos de capital, auditoria e segregação patrimonial. Temas que já constam na Consulta Pública nº 109/2024 do BCB sobre prestadoras de serviços de ativos virtuais (PSAVs).

Para Castaneda, o que está se desenhando é um novo ciclo de integração inevitável. ‘A tecnologia blockchain não vai substituir o sistema financeiro. Na realidade, vai se integrar a ele. E, ao se integrar, vai mudá-lo de dentro’, disse.

O executivo acredita que o Brasil está diante de uma oportunidade única: ao combinar infraestrutura financeira moderna (como o Pix e o SPB) com regulação aberta à inovação, o país pode se tornar referência global em integração regulatória de blockchain e câmbio digital.

Disclaimer: Coinspeaker está comprometido em fornecer reportagens imparciais e transparentes. Este artigo tem como objetivo fornecer informações precisas e oportunas. Mas não deve ser considerado como conselho financeiro ou de investimento. Como as condições do mercado podem mudar rapidamente, recomendamos que você verifique as informações por conta própria. E consulte um profissional antes de tomar qualquer decisão com base neste conteúdo.

Notícias de Criptomoedas
Leonardo Cavalcanti

Leonardo Cavalcanti é jornalista especializado em criptomoedas, blockchain e finanças digitais. Além de tocar projetos próprios como o podcast BlockHistory. Também trabalha em desenvolvimento de negócios no ecossistema cripto como parceiro comercial Azify, com foco em parcerias estratégicas, tokenização e soluções de infraestrutura financeira.